Passaram, por mim, há poucochinho tempo, carros sisudos, fugidios, potentes e poderosos, com um brilho de volframite. Apeteceu-me gargalhar com o professor Aquiles Arquelau.
Perante o poder (e seus comedores de migalhas) burro, bruto e besta (no sentido apocalíptico), sempre me apeteceu ironizar com desdém. Mas, por momentos, antes de ironizar - ou depois - reflicto sobre a capacidade imaginativa, criadora, sensível, de imensos lusitanos http://www.youtube.com/watch?v=Q805gD44PnY que, pasme-se ou não(! ), não é extensível aos nossos poderosos que nos calham em rifa ou resultam de momentos de doentia escolha.
Os nossos poderosos, na sua bestialidade, criam crises, enfurecem e baralham as massas para que elas, acotovelando-se e esgadanhando-se por fim se acomodem e glorifiquem com hossanas paizinhos freudianos ou sebastiões bandarrianos, e justifiquem alguns escribas. Por cá os nossos poderosos só têm um olho zarolho!
Como eles, se conhecessem(!), gostariam de criar:
UM DIA NA VIDA DE ETELVINO
Etelvino benzeu-se ao passar em frente à foto à foto do Presidente tal como devia ser, abriu a porta, saiu e fechou-a com duas voltas de chave. Depois ligou o campo das minas protector. Por causa dos ladrões e dos outros.
Desceu a escada, cumprimentou o porteiro com o habitual «Viva o Presidente e o Primeiro», a que o porteiro retorquiu, sorumbático, com o costumeiro «Liberdade em segurança para ti, irmão».
Estava na rua.
Correu um pouco, para chegar à bicha a tempo. Eram seis e meia e tinha que estar no emprego às nove, caso contrário seria despedido com justissima causa. As leis socialistas do governo eram claras e exactas, graças a Deus.
A bicha do autocarro estava normal. Lá ao longe via-se o poste da paragem.
(...)Perante o poder (e seus comedores de migalhas) burro, bruto e besta (no sentido apocalíptico), sempre me apeteceu ironizar com desdém. Mas, por momentos, antes de ironizar - ou depois - reflicto sobre a capacidade imaginativa, criadora, sensível, de imensos lusitanos http://www.youtube.com/watch?v=Q805gD44PnY que, pasme-se ou não(! ), não é extensível aos nossos poderosos que nos calham em rifa ou resultam de momentos de doentia escolha.
Os nossos poderosos, na sua bestialidade, criam crises, enfurecem e baralham as massas para que elas, acotovelando-se e esgadanhando-se por fim se acomodem e glorifiquem com hossanas paizinhos freudianos ou sebastiões bandarrianos, e justifiquem alguns escribas. Por cá os nossos poderosos só têm um olho zarolho!
Como eles, se conhecessem(!), gostariam de criar:
UM DIA NA VIDA DE ETELVINO
Etelvino benzeu-se ao passar em frente à foto à foto do Presidente tal como devia ser, abriu a porta, saiu e fechou-a com duas voltas de chave. Depois ligou o campo das minas protector. Por causa dos ladrões e dos outros.
Desceu a escada, cumprimentou o porteiro com o habitual «Viva o Presidente e o Primeiro», a que o porteiro retorquiu, sorumbático, com o costumeiro «Liberdade em segurança para ti, irmão».
Estava na rua.
Correu um pouco, para chegar à bicha a tempo. Eram seis e meia e tinha que estar no emprego às nove, caso contrário seria despedido com justissima causa. As leis socialistas do governo eram claras e exactas, graças a Deus.
A bicha do autocarro estava normal. Lá ao longe via-se o poste da paragem.
Chegou a tempo. Não foi despedido.
(...)
Foi para a bicha do autocarro, após um seco «Viva o Presidente e o Primeiro» aos colegas que entravam para o turno nocturno.
Sob a protecção dos homens e dos cães da Policia de Segurança Pélvica que enquadravam a longa fila, sentiu-se de novo livre. E seguro.
Às oito e trinta e cinco chegou a casa. Desligou as minas e abriu a porta. Tudo em ordem. Graças ao actuante governo, pensou. E benzeu-se, ao passar em frente à foto do Presidente.
Tinha vinte e cinco minutos para comer, que depois era a hora exacta da televisão. Não faltar nunca às Telenoticias. Os ministros vinham lá todos. Sempre. Às vezes até o Primeiro e mesmo Presidente!
Resolveu ser extravagante. Que diabo, um dia não são dias. Comeu três fatias de pão. E. numa loucura desenfreada, bebeu um copo de vinho! De súbito sentiu-se comprometido. E a austeridade tão necessária à Nação?(...)Depois, ao mirar a foto anafada do Primeiro que alteava sobre o televisor, sentiu-se aliviado. Tudo levava a crer que o Primeiro devia comer com frequência três fatias de pão ou até mais. E mesmo, quem sabe, provavelmente bebesse dois ou três copos de vinho. Bem, o Primeiro era o Primeiro. No entanto... Ficou definitivamente aiviado.
(...)
O televisor continuava escuro. E mudo. Que seria?
Ia levantar-se para verificar, quando a imagem surgiu.
A bandeira da pátria ondeando.
Etelvino recostou-se. Deliciado. A pátria ondeava, tudo estava bem.
A voz do locutor surgiu, crispada e seca:
«SENHORES TELEOUVINTES; UM COMUNICADO DE URGÊNCIA DA ULTIMA HORA. ATENÇÃO. A PATRIA ENCERRA PARA OBRAS DURANTE TEMPO AINDA NÃO DETERMINADO. ATENÇÃO. REPETIMOS. A PATRIA ESTA ENCERRADA A PARTIR DESTE MOMENTO.»
(...)A última visão que teve foi a do retrato do Primeiro. Anafado. E enevoado.
Etelvino arrotou. O coração parou-lhe.
Mário Henrique Leiria
2 comentários:
Vamos tentar "fazer obras" ANTES que a Pátria tenha que "encerrar"!!
Não percamos o direito à indignação!
Que a nossa voz se faça ouvir!!
Falarei,falarei....até que alguém me oiça!!!
Boa Trovisco!
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